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uma espécie de refrão de coisas que eu via, estava impregnado desse mun-
do. Eu achava o concurso de
miss
uma exploração. Fiz tambémum trabalho
sobre o Chacrinha.
Que fazia um programa de auditório. Aliás, esse programa teve uma
influência grande na geração de vocês, tanto na pintura, quanto na
literatura e na música.
O Hélio Oiticica, o Caetano Veloso e o Gilberto Gil foram ao programa do
Chacrinha. Ele lançava comida para as pessoas da platéia. Realmente eu fui
a primeira pessoa que percebeu que era ummomento umpouco “pão e cir-
co”. Ele manipulava de certa forma esse tema da fome. Ao mesmo tempo
eu admirava e sentia aflição em relação àquilo. Fiz um boneco e pergun-
tava para as pessoas na galeria o que é o homem e que ele come, tirei da
barriga do boneco instrumentos de trabalho. Alguém gritou: “O que o povo
tem?”. Eu respondi: “Fome!”. Desabou feijão em cima da cabeça de todos
na galeria. Foi a primeira vez que lidei com o tema da comida. Usávamos
a palavra
happening
[acontecimento, em inglês]. Uma palavra importada,
mas a única que explicava o que aquela ação representava em uma galeria
de arte. Não era instalação, como hoje.
Era de fato um acontecimento no sentido de intervir na vida das pessoas
em determinados momentos.
Lembro-me de que alguém gritou: “Vamos ao Sachas” - um bar onde se
ouvia música ao vivo. Mas o pessoal entendeu: “Vamos ao saque”. Come-
çaram a roubar todas as obras da parede e algumas pessoas carregaram
obras do Antonio Dias e do Roberto Magalhães pelas ruas e levaram mi-
nhas
Caixas de Morar
, os pintores ficaram sem ter o que fazer.
Quem são os seus amigos desse tempo? Com quem você discutia sua arte?
Principalmente, Antonio Dias e o Roberto Magalhães. O Roberto estava
sempre presente e era muito boêmio, já o Antonio era mais polêmico, mais