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Papai já fazia anúncios e logotipos em Berlim, até que não pôde mais tra-
balhar e trouxe toda a tecnologia de lá para o Brasil. Ele era, já para a épo-
ca, uma pessoa habilitada e moderna - Berlim era uma das cidades mais
animadas e interessantes do mundo. Ele me obrigava a desenhar letras e
só depois me liberava para jogar botão ou futebol. Na minha família, mui-
tas pessoas eram ligadas à tipografia, eu também tinha um avô calígrafo.
Comecei a trabalhar em litografia desde cedo. Quando entrei na Escola de
Belas Artes, me interessei em trabalhar nas pedras e também trouxe para
as artes plásticas um pouco desse mundo do preto e branco, que era a pu-
blicidade na época.
Os primeiros quadros que fiz foram em preto e branco, porque assim eram
os jornais. Sabia que se fizesse algo bom em preto e branco, quando fos-
se reduzido para ser publicado ficaria bom. Eu observava a técnica que as
pessoas trabalhavam: era um fundo preto e você abria as luzes brancas no
gesso. Depois fui fazer gravura, usei esse método, cavar a madeira e abrir
as luzes.
Esse mundo de preto e branco foi o começo. Em 1966, fiz um álbum com
o Carlos Scliar, intitulado
Felix Pacheco 1566 166
, com cinco serigrafias, em
que entrou essa obra da identidade. Outro excelente artista, pintor e im-
pressor, o Dionísio del Santo permitia que cada um de nós usasse seu ate-
liê por um mês.
Sou 1 566 166 logo existo
. O título era o número da minha
carteira de identidade, devido às agruras pelas quais passei quando servi
no Exército, no Forte de Copacabana, na época da renúncia de Jânio Qua-
dros. Lá, todos tinham números. Alguns ficaram na minha memória, como
o capitão Dickens, que pediu para eu desenhar as plantas dos planos de
defesa do forte. Eu terminei o serviço militar como cabo atirador. O Cabo
202! Olhei a carteira de identidade e pensei que se não tivesse um número
ninguém iria me reconhecer.
É uma metáfora rica na sociedade de massa, não? Ter de se identificar por
um número e ao mesmo tempo se perder no meio da sociedade de massa
à procura de sua identidade.
Você tocou, emumpontomuito importante. Como falei antes, eu trabalha-
va muito em preto e branco e usava também materiais em tom de terra, e