Página 60 - Rubens Gerchman - O REI DO MAU GOSTO

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realidade. Não lhe interessava inventar fantasias, mas sim interpretar as
notícias do rádio. O
Repórter Esso
era o programa que contava os aconte-
cimentos do mundo. Assim a realidade era já o eixo de sua história lúdica.
Ele viveu um Brasil de ditaduras militares e, apesar de uma de suas paixões
ser ver e reler mil vezes a coleção de revistas de seu pai sobre a guerra,
onde aprendera a distinguir meticulosamente cada um dos aviões, carros
e tanques, Gerchman sempre foi umpacifista. Ao terminar o curso colegial,
entrou para a Escola Nacional de Belas Artes, curso que interrompeu quan-
do teve que prestar serviço militar. Mas, no quartel, um comandante des-
cobriu sua paixão e lhe deu a tarefa de desenhar as diferentes perspectivas
dos pontos de defesa do forte de Copacabana. Ele por outros caminhos vol-
tava a desenhar as letras que seu pai lhe havia ensinado, e que os militares
utilizavam para a sinalização de todos os códigos do quartel.
Apesar de ter voltado mais tarde à Escola de Belas Artes, ele não terminou
seus estudos porque já se havia formado nele uma insatisfação permanen-
te. Rejeitou o academismo obrigatório, assim como iria rejeitar sistemati-
camente o que tivesse cheiro de autoritário.
O compromisso com a realidade
A vida estava emCopacabana. A sua criação artística tinha um interesse no
Rio de Janeiro. Ele trabalhava de dia e pintava de noite aquilo que o interes-
sava: a vista urbana de sua janela. A claustrofobia do espaço e as vivências
simultâneas que ocorriam quando se acendia uma luz e se apagava outra
num edifício o levaram a uma primeira época, que foi fundamental porque
formulou uma das inquietudes que serão eixos de seu trabalho:
Moradias
Coletivas
. Ele morava no edifício 135 da Rua Barata Ribeiro. Ali em frente,
estava um corte transversal do que era a vida urbana, a simultaneidade de
alguns prédios em cujas janelas tudo acontecia. Tanto que o antropólogo
Gilberto Velho realizou um estudo sobre aquele edifício, o 200.
Essa obsessão pela realidade e pelo entretenimento artístico levou-o a
conseguir seu primeiro trabalho na editora de
Manchete
, onde diagramava
as fotonovelas
Sétimo Céu
e outras páginas daquela revista. A partir desse
balcão, pisando em duas realidades, ele concentra a atenção no que serão