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expressãomais livre, que lhe domina o espírito em rebelião permanente e o
obriga a rechaçar o lugar comum. Gerchman sente interiormente que, em
cada momento estético, habita outras circunstâncias alcançáveis, e que o
formalismo não leva senão à repetição. Assim ele segue de perto o que
Baudrillard afirmou:
A tecnologia evolui, a linguagem transforma-se, a voz
muda, o destino nos incumbe
... Ele é um transgressor que sabe que
o fim do
fim é viver além do fim, quaisquer que sejam os meios
; que, em seu mundo
criativo, se compromete a designar coisas que jamais serão a expressão da
inocência; e que busca precipitá-Ias adiante da realidade, no êxtase de sua
linguagem, que já é um fim em si mesma. Não procura pois justificar um
mundo plástico, mas sim explicar as possibilidades que integram imagens
totalmente próprias. Trata-se de abordar um homem e uma obra que têm
consolidado linguagens. E que conseguiu de ummodo tão absoluto seguir
uma necessidade imperativa de exteriorizar a complexidade da existência
através de impulsos e reflexões que, por um lado, o levam a construir nas
multidões
abstração carregada de grafismos, com uma geometria muito
marcada que se mostra sintética em relação à escultura. E por outro lado
está a figuração plana, nos anos 60, com que ele buscou, revolucionaria-
mente, a expressividade na utilização e na incorporação de objetos e ele-
mentos conceituais e que agora cria em uma pintura mais expressiva.
O ponto de vista de Gerchman é sempre o mesmo: trata-se de um olhar
de
voyeur
, de uma testemunha distante, que observa multidões de longe e
casais de perto. É como se fosse uma testemunha que observa desde com-
portamentos sociais até a intimidade dos outros. Esse ponto de vista, em
certos momentos de cumplicidade distante, é que confere a seus casais
um erotismo especial carregado de sedução.
Por outro lado estão os elementos da vida cotidiana, a possibilidade de
que a palavra, ou a poesia de um objeto encontrado, fale da condição hu-
mana. Interessa-lhe o símbolo e o fetiche. Ele parte de temáticas sociais
para construir novas referências urbanas. Entra e sai do urbano social para
o sociológico, dos signos antropológicos para as relações filosóficas, sem
perder jamais a sagacidade do que implica viver de repente entre o frenesi
da uma era de mudanças radicais, histórias paralelas, liberdades humanas
e confinamentos infernais. A vida convulsionada do homem segue trilhas
de um tempo que passou pela crise existencial do anos 60, pela devastação