95
Quando mais massificados são nossos desejos, mais eles se camuflam
como se fossem particulares e individuais. Numa sociedade como a nos-
sa em que tudo, inclusive o sexo, é transformado em mercadoria e que o
dinheiro parece ser o principal elemento que possibilita a satisfação dos
desejos, mesmo que muitos de nossos desejos sejam criados por aparên-
cias artificiais tecnicamente produzidas, talvez o sexo tal como a tradição
hindu o compreende, ligado ao amor e a uma dimensão espiritual, seja
dos poucos redutos que resistem à fascinação produzida pela estética da
mercadoria. Aqui não há aquela satisfação provocada pelo consumo que
tão rapidamente é substituída por uma insatisfação e descontentamento.
Entretanto, os trabalhos não deixam de ser também mercadorias disponí-
veis para o consumo.
Assim como boa parte da arte pop soube se beneficiar da contradição e da
eliminação da oposição entre cultura de massa e a arte erudita, esses tra-
balhos de Gerchman problematizam a relação entre o sagrado e o profano
e, sem penderem para um ou outro lado, restabelecem uma ambigüidade
originária e própria da arte, algo entre uma fuga desse mundo ocidental
como redescoberta de si, uma auto-ironia e, ao mesmo tempo, uma inevi-
tável adesão ao mundo das mercadorias.
Cauê Alves
(São Paulo, 1977) é mestre e doutor em Filosofia pela Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP),
instituição na qual também atua como professor. Foi curador adjunto da 8ª Bienal do
Mercosul (2011) e do 32º Panorama da Arte Brasileira do MAM-SP (2011), além das
mostras
Mira Schendel: Avesso do avesso
(São Paulo: IAC, 2010) e
Quase líquido
(São
Paulo: Itaú Cultural, 2008). Desde 2006, é curador do Clube de Gravura do MAM-SP.