43
a própria história do artista, sua biografia, um Mercury vermelho, o filho,
Mira, o pai, imagens carregadas de lirismo e poesia.
Hoje, todas estas imagens, já tão nossas, se confundem ou se diluem na
própria matéria pictórica. O grande amor de Gerchman, é, sempre foi, a
pintura, que ele respira como o ar que o mantém vivo, que ele faz con-
fundir integralmente com sua vida. Como se viver, para ele fosse produzir
imagens, isto é, pinturas. Porque, hoje, mais livre, tudo nele vira pintura,
de menino sentado no cocoruto da pedra como um pequeno monge a
contemplar as irizações gráficas no lago da tela, ou um
petit tarzan
en-
gatinhando na selva da cidade grande, o menino no colo da mãe, entre as
pernas do pai, jogando futebol de várzea num subúrbio qualquer do Rio,
menino que some para reaparecer depois, já homem, no banco de traz,
transando aquela que já foi Miss.
Madura, a pintura de Gerchman explode generosa, farta, avassaladora
mesmo, sem qualquer compromisso estilístico, ora crescendo como uma
vegetação de arabescos, de grafitos, quase-Ietras, ora criando áreas com-
pactadas, de cores surdas ou vibrantes. O coração vibra, é tempo de pintu-
ra. Gerchman está feliz, é isso o que diz sua pintura atual.
Frederico Morais
(Belo Horizonte, 1936) é jornalista, professor, curador e crítico de
arte. Organizou diversas mostras e eventos, entre eles Do corpo à terra (Belo Horizonte,
1970), Domingos da criação (Rio de Janeiro, 1971) e o Ciclo de Exposições sobre Arte
no Rio de Janeiro (Galeria da Banerj, 1984-1986). Assim como Rubens Gerchman, fez
parte do júri do IV Salão Global (1976) e foi julgado no caso do artista Lincoln Volpini,
condenado pela ditadura militar pela obra
Penhor da igualdade
. É autor de
Artes plás-
ticas: a hora atual
(Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979) e
Cronologia das artes
plásticas no Rio de Janeiro: 1816-1994
(Rio de Janeiro: Topbooks, 1995), entre outras
publicações. Entre as reedições de seus textos, ver os livros
Frederico Morais,
organiza-
do por Silvana Seffrin (Rio de Janeiro: Funarte, 2004) e
Crítica de arte no Brasil: temá-
ticas contemporâneas
, organizado por Glória Ferreira (Rio de Janeiro: Funarte, 2006).